A história de Dino D’Santiago no Coliseu dos Recreios
Um Coliseu dos Recreios esgotado para ouvir músicas de BADIU (2021), KRIOLA (2020), Mundu Nôbu (2018), e o EP SOTAVENTO (2019), tornou 2 de abril de 2022 o dia de Dino D’Santiago, nas palavras do próprio artista.
Antes de Dino D’Santiago entrar em palco, ouvia-se a voz de uma mulher, o que arrancou alguns gritos e aplausos do público que ficava cada vez mais ansioso para o concerto, e o êxtase chegou quando as luzes foram ficando mais escuras e já se ouvia berros de “Dino! Dino! Dino”. Apresentou-se sozinho neste novo espetáculo, apenas com um ecrã atrás, e dominou a sala de cima a baixo. Logo no princípio, parou durante alguns segundos para olhar a vasta multidão. Depois, partiu para os temas “SANTIAGO (Jorge & Andresa)“, e, enquanto se ouvia os primeiros acordes de “Sofia”, falou para o público e disse “vou ver quem daqui realmente conhece Cabo Verde e os seus sabores” e “quem já comeu cachupa que faça barulho!”, seguido pelos gritos de muitas pessoas.
Também deu espaço para os seus colegas e colaboradores do seu já longo percurso na música. O primeiro foi Slow J, em “Esquinas”, e mal se ouviu o primeiro verso, com uma parte em crioulo, o Coliseu estremeceu de emoção e Dino irrompeu para a frase “Nas curvas do bairro/ Nem todo o tuga é luso”. A segunda foi a promissora Kady, com quem cantou uma música do próximo álbum da artista. A terceira foi Nayela, no tema “Nha Kodê”, com a sua belíssima voz. O quarto foi Julinho Ksd, que entrou de repente no palco para “Kriolu” a correr de um lado para o outro. E ainda, Alicia Rosa, que se encontrava na primeira fila, na clássica “Como Seria”, interpolado por “APESHIT” de Beyoncé e Jay-Z. E foi essencial mostrar este leque variado de artistas para tantas pessoas num momento tão especial para o artista e música nacional.
No alinhamento, fizeram parte algumas das suas músicas que mais marcaram a sua carreira até ao momento e as que mais fizeram as pessoas dançar, como, “Nôs Funaná”, “Kem Ki Flau”, “Pé Ratxado” e “Nova Lisboa”, com o público a cantar de volta “Qualé ideia?”. Inclusive, houve tempo para temas mais calmos com “Arriscar”, “My Lover” e uma parte introspetiva em “Badia”, a primeira do seu mais recente álbum.
Não foi apenas a sua história musical e algumas das dificuldades que passou para chegar até àquele palco que falou, também contou a de Cabo Verde, através das vozes da sua mãe e irmã, que passavam entre cada música, e abordou as questões coloniais que estão ligadas, infelizmente, ao arquipélago africano. Ainda mais, o artista percorreu as suas origens de Santiago, Quarteira e Lisboa, o que está sempre presente nas suas melodias e letras, com essas vozes e as mensagens que transmitiu durante uma hora e meia.
Quase no final, depois do encore, o último convidado, Branko, entrou em palco para tocar “Lokura”, do novo disco Badiu, e “Tudo Certo”, de Nosso (2019) do DJ e produtor, com Dino a cantar no meio do público grande parte do tema. Assim, acabou em grande e em festa um dos concertos mais importantes que passou pelo Coliseu dos Recreios nos últimos meses.
Durante o espetáculo, o amor de Dino D’Santiago pela sua música e raízes cabo-verdianas foi notório e passou bem para as quatro mil pessoas que o viram, e, ao mesmo tempo, reparou-se que o artista soa cada vez melhor ao vivo. Até se pergunta porque é que é este concerto não aconteceu há mais tempo, e se irá abrir a possibilidade de mais artistas que cantam em crioulo de encherem esta sala nos próximos tempos, o que agora parece mais provável de acontecer. Apenas se pode esperar, além de toda a importância e história que o artista trouxe, que também tenha aberto um caminho novo para o próprio e para quem vier a seguir. E, ainda, mostrou que todas as pessoas podem e devem-se unir no mesmo espaço e pela mesma causa. Além disso, nas palavras de Branko, assistiu-se à história do artista português mais importante da atualidade.
Texto e fotos: Iris Cabaça